Ricardo Marques

Fumaça

Publicado: 22/09/2024 11:13 - Atualizado em 22/09/2024 11:52 - 0 comentário


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Quando adolescente tentei com todas as forças aprender a fumar e não consegui. Simplesmente não aprendi a tragar. E, dizem, fumar sem tragar é como beber cerveja sem álcool. Pior que fazer sexo sem amor. Mas a beleza da fumaça que se esvaía pelo ar me seduzia. A fumaça do cigarro é a grande viagem que os fumantes ainda não se deram conta. Hoje, eu fumo charuto, ainda que raramente. Para fumar charuto não precisa tragar. Aliás, não se traga fumando charuto, se degusta. A fumaça do charuto é mais prazerosa que a do cigarro. Por ter mais volume, é mais densa e demora mais, antes de esvair-se no ar. Uma barofada, e pronto... mil idéias se formam à frente dos olhos.

A solidão é a melhor amiga da fumaça. Um trago, e logo o pensamento ganha asas e sai por aí, sem destino, vagando e criando formas por lugares que só a alma conhece. Não foi à toa, serviu de inspiração para grandes compositores. Raimundo Fagner cantarolou um poema de Florbela Espanca,  uma obra de arte. Longe de ti são ermos os caminhos/ Longe de ti não há luar nem rosas/ Longe de ti há noites silenciosas/ Há dias sem calor, beirais sem ninhos...”

Os versos de “Fumo” eternizaram o enigma da fumaça. A canção é poesia pura. Como o são ‘as viagens da fumaça’. Que não me entendam mal. Aqui não vai qualquer apologia ao uso da maconha. Até porque, para ficar ‘doidão’ fumando maconha, é preciso saber tragar. Ademais, eu prefiro uma cerveja gelada, uma taça de vinho ou uma cachacinha da serra.

Sou careta, mas viajo nas mil e uma faces desenhadas pela fumaça. Observando a desenvoltura da fumaça ao cortar o ar, é possível abrir a porta do passado e voltar no tempo. Dá para seguir adiante, também, e enxergar um cenário futuro, ainda que meramente imaginário.

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