Ricardo Marques

POR RUY PALHANO 

Certamente, é um dos piores sentimentos humanos e um dos mais temidos. A vingança é ameaçadora e uma resposta ou ação motivada pelo desejo de retribuir um dano, ofensa ou injustiça sofridos, visando infligir sofrimento ou punição à pessoa ou grupo considerado responsável pelo mal causado.

Este impulso pode ser influenciado por diferentes motivos, como por exemplo sentimentos de raiva, indignação, ou a busca por justiça, e suas manifestações variam amplamente, desde atos simbólicos ou verbais até ações físicas extremas. A vingança é um tema complexo que tem sido explorado em diversas áreas do conhecimento humano, incluindo psicologia, sociologia, antropologia, e direito, refletindo sua presença e impacto significativos nas relações humanas e na sociedade como um todo.

Etimologicamente, a palavra "vingança" tem sua origem no latim "vindicta", que significa "reivindicação de direito" ou "punir". Com o passar do tempo, o termo evoluiu para incorporar a ideia de retaliação ou punição por um mal-recebido. A transformação semântica reflete a mudança na percepção social da justiça e da retribuição.

Essa evolução semântica reflete o contexto histórico e cultural em que a justiça pessoal, muitas vezes exercida através da vingança, era um meio comum de resolver disputas antes do estabelecimento de sistemas judiciais mais formalizados. Com o tempo, o conceito de vingança foi sendo cada vez mais regulado e desencorajado pelas sociedades, à medida que os sistemas legais evoluíam para oferecer meios institucionalizados de resolução de conflitos e reparação de injustiças

Psicologicamente, a vingança pode ser entendida como uma tentativa de restaurar a sensação de justiça e equidade pessoal após uma transgressão. No entanto, muitas vezes, ela não traz a paz ou resolução esperada, podendo, em vez disso, perpetuar um ciclo de retaliação e sofrimento.

Do ponto de vista sociológico, a vingança pode ser vista como um meio de autoafirmação e de manutenção ou restauração da honra e status social, especialmente em culturas ou contextos em que as instituições legais e judiciais são percebidas como ineficazes ou inacessíveis. Além do mais a vingança frequentemente pode levar a ciclos contínuos de retaliação, onde cada parte procura revidar, potencialmente escalando o conflito a níveis mais destrutivos.

Embora possa proporcionar uma sensação temporária de alívio ou satisfação, a vingança muitas vezes acarreta consequências emocionais negativas prolongadas, incluindo remorso, culpa, e uma maior sensação de amargura ou descontentamento.

O impacto provocado pela vingança na perspectiva social pode levar a destruição das relações interpessoais e sociais, gerando desconfiança e medo, o que pode isolar ainda mais os indivíduos ou grupos envolvidos. Além do mais a vingança tem também fortes impactos nas questões legais e éticas. Ações de vingança podem levar a consequências legais, incluindo penalidades criminais para quem as práticas, além de levantar questões éticas sobre justiça e moralidade.

Há uma enorme relação do ódio com a vingança e uma situação por demais complexa onde ambas as condições estão profundamente entrelaçadas, pois ambos emergem de sentimentos humanos intensos e muitas vezes negativos. O ódio pode ser

visto como um sentimento ou emoção que alimenta o desejo de vingança, enquanto a vingança pode ser a ação ou comportamento resultante desse sentimento.

Nesta relação o ódio pode funcionar como uma espécie de catalisador pois como sabemos ódio é um sentimento intenso de aversão, repulsa ou antipatia que uma pessoa pode sentir por outra pessoa, entidade, objeto ou situação. Pode ser motivado por diversas razões, incluindo experiências passadas negativas, preconceitos, inveja ou mal-entendidos. Quando o ódio é direcionado a um indivíduo ou grupo por um mal percebido ou real, ele pode se tornar o catalisador para o desejo de vingança. Nesse contexto, o ódio alimenta a necessidade de responder ou retribuir a dor ou dano sofrido, na busca por um senso de justiça ou equilíbrio.

Por outro lado, a vingança pode funcionar como manifestação desse desejo de retaliação. É uma ação deliberada com o objetivo de punir ou fazer justiça por conta própria, em resposta a um mal percebido. A vingança é frequentemente motivada pelo desejo de fazer o outro experimentar a mesma dor ou sofrimento que foi infligido, baseando-se na ideia de "olho por olho, dente por dente". Embora possa proporcionar uma sensação momentânea de satisfação ou alívio para quem a prática, a vingança raramente resolvem o sentimento subjacente de ódio e, muitas vezes, pode perpetuar um ciclo de violência e ressentimento.

Como vimos anteriormente do ponto de vista psicológico e social, entender a relação entre ódio e vingança é crucial para abordar conflitos interpessoais e coletivos de maneira eficaz. Promover o diálogo, a empatia e o perdão pode ser chave para quebrar o ciclo de ódio e vingança, ajudando indivíduos e comunidades a encontrar caminhos para a reconciliação e a paz.

Modernamente e na cultura hodierna a pode ser analisada sob várias perspectivas, incluindo a sociológica, psicológica, histórica e artística. Na modernidade, a vingança muitas vezes é retratada e entendida através de uma lente diferente daquela das sociedades tradicionais ou antigas, onde a vingança podia ser uma parte aceita e até mesmo esperada das relações sociais e da justiça.

Na história a transição de sociedades onde a vingança era uma prática socialmente regulada para sistemas onde a lei busca monopolizar a violência e a resolução de conflitos reflete mudanças significativas na forma como as sociedades organizam-se e percebem a justiça e a moralidade.

Na arte e na literatura a vingança é um tema recorrente e poderoso, explorado em diversas formas, desde tragédias gregas, como as de Ésquilo e Sófocles, até produções contemporâneas no cinema, literatura e teatro. Na modernidade, a representação da vingança muitas vezes questiona a moralidade e as consequências dos atos de retaliação,

Em resumo, a vingança na modernidade é um fenômeno complexo, influenciado por mudanças sociais, legais e culturais. Sua representação e percepção variam amplamente, refletindo tensões entre ideais de justiça e práticas de retaliação, bem como entre a lei formal e as normas sociais.

*Médico Psiquiatra, Escritor, Membro Efetivo da Academia Caxiense de Letras (ACL) e Dr. Honoris Causa pela Emil Brunner World Universit -EBWU. Flórida - EUA